Era uma daquelas manhãs perfeitas de
inverno; o sol brilhava em seu lugar mas não nos condenava com seu fogo
infernal, e uma boa blusa de lã era bem-vinda enquanto se tomava um café recém
passado na varanda. Eu havia acordado com uma dor de cabeça dos diabos mas
decidi ignorá-la apenas em função daquele belíssimo dia.
Então eu estava sentado na varanda, e foi aí
que eu vi minha esposa – com o tempo, decidi que esquecer seu nome era melhor –
conversando com nosso vizinho, Juan Hernadéz, me lembro bem daquele filho da
puta: era provavelmente mais velho que nós mas não aparentava ter mais que
trinta anos, sua pele tinha um bronzeado saudável e natural, ele era médico –
pediatra! – e tinha um sorriso incrível que o beneficiaria muito bem se ele
resolvesse se tornar um pedófilo. Minha esposa o adorava, e todas as manhãs eu
era obrigado a sentar na minha varanda e observar os dois rindo de algum
comentário tolo, com os dedos finos de minha esposa sempre pousados sobre seus
ombros, até o momento em que ele subitamente olharia na minha direção e me
concebesse um aceno amigável – e aí,
cara! Foi ótimo comer sua esposa ontem, espero que você também tenha gostado
– e eu retribuiria, por causa da porra da política de boa vizinhança – um dia
nossa casa poderia pegar fogo, um dia talvez precisássemos de um babá ou de um
pouco de açúcar. Naquele dia eu não acenei de volta e essa foi sua deixa para
beijar o rosto de minha mulher – muito próximo a seus lábios – e voltar para
seu gramado estupendamente mais verde que o meu.