quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

[Rabiscos] Era apenas um vaso

   Era uma vez um solitário vaso que passava seus dias observando o pó acumulado na madeira da estante, sem conhecer (ou se interessar por) uma vida diferente.
   Certo dia surgiu um livro ao seu lado.
   O pobre do vaso nem sequer sabia o que era aquilo, então apenas continuou na sua, fingindo que nada havia mudado. “Hm, acho que agora tem mais poeira ali naquele canto; deve ter sido o vento”.
   O livro, porém, era lá muito sabido do mundo em que viviam. E muito metido também, já que era obrigado a ficar sempre ao lado de vasos e abajures que nunca sabiam de nada. Por isso, foi logo puxando conversa com o nosso vaso.
   - Sabe, essas suas figuras lembram-me a Índia. Eu estive lá este ano, é claro. Foi da Índia que veio, amigo?
   E o vaso não sabia o que responder. “Esse aí deve ser... como dizem?... biruta!”
   - Quem é Índia? – perguntou por fim.
   O livro bufou, fingindo irritação – Ora, até que não me espanta você ser tão burro. Provavelmente sou o primeiro livro que chega perto desse lugar – você chama isso de estante? – E você, de tão ignorante, não deve nem importar-se de ficar o tempo todo aqui sem fazer coisa alguma e dependendo de qualquer um.
   O vaso não sabia o que era uma ofensa, mas sentiu-se profundamente ofendido sem saber.
   - Não dá pra se saber de tudo! – choramingou.
   - Ora, então pergunte; qualquer coisa eu lhe respondo.
   - Sabe, às vezes me enchem de água. E, às vezes, pela janela, eu vejo algo que chamam de chuva. Então, como é?
   - Bem, a chuva é apenas precipitação de água. Quando...
   - Não, não, não. Eu quero saber como é a... a... sensação!
   O livro emudeceu. Sabia tudo sobre a chuva, sobre a água, sobre nuvens e sobre a atmosfera terrestre. Mas a sensação da chuva? Não entendia como alguém poderia querer saber sobre uma coisa tão estúpida.
   Uma risadinha veio de baixo da estante. – Meu amigo, é uma coisa absurdamente reconfortante. Às vezes eu penso que é a Natureza nos dizendo que tudo está bem.
   De fato, havia um par de sapatos sob a estante, feio, sujo e rasgado, pousado numa poça de lama.
   - Eu já fui a muitos lugares, ouvi muitas pessoas e senti todos os tipos de chuva...
   O livro, indignado por um objeto imundo e tresloucado como aquele querer lhe ensinar alguma coisa. Em sua fúria e desejo de insultar nosso sábio sapato, ele, que estava numa posição muito precária, acabou caindo da estante e deu de capa na lama.
   O sapato achou muito engraçado um objetozinho como aquele conseguir guardar  tanta petulância dentro de si.
   - Deixe de ser tolo, camarada. Seja mais como eu: me importo mais com algumas humildes experiências do que com uma inteligência comprada e arrogante como a sua.

  
 Por - Ana Caroline (eu!), Jéssica Santos, Vitor Luciano, Natália Ribeiro e Maria Victória

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