Era uma vez um solitário vaso que passava
seus dias observando o pó acumulado na madeira da estante, sem conhecer (ou se
interessar por) uma vida diferente.
Certo dia surgiu um livro ao seu lado.
O pobre do vaso nem sequer sabia o que era
aquilo, então apenas continuou na sua, fingindo que nada havia mudado. “Hm,
acho que agora tem mais poeira ali naquele canto; deve ter sido o vento”.
O livro, porém, era lá muito sabido do mundo
em que viviam. E muito metido também, já que era obrigado a ficar sempre ao
lado de vasos e abajures que nunca sabiam de nada. Por isso, foi logo puxando
conversa com o nosso vaso.
- Sabe, essas suas figuras lembram-me a
Índia. Eu estive lá este ano, é claro. Foi da Índia que veio, amigo?
E o vaso não sabia o que responder. “Esse aí
deve ser... como dizem?... biruta!”
- Quem é Índia? – perguntou por fim.
O livro bufou, fingindo irritação – Ora, até
que não me espanta você ser tão burro. Provavelmente sou o primeiro livro que
chega perto desse lugar – você chama isso de estante? – E você, de tão
ignorante, não deve nem importar-se de ficar o tempo todo aqui sem fazer coisa
alguma e dependendo de qualquer um.
O vaso não sabia o que era uma ofensa, mas
sentiu-se profundamente ofendido sem saber.
- Não dá pra se saber de tudo! –
choramingou.
- Ora, então pergunte; qualquer coisa eu lhe
respondo.
- Sabe, às vezes me enchem de água. E, às
vezes, pela janela, eu vejo algo que chamam de chuva. Então, como é?
- Bem, a chuva é apenas precipitação de
água. Quando...
- Não, não, não. Eu quero saber como é a...
a... sensação!
O livro emudeceu. Sabia tudo sobre a chuva,
sobre a água, sobre nuvens e sobre a atmosfera terrestre. Mas a sensação da
chuva? Não entendia como alguém poderia querer saber sobre uma coisa tão
estúpida.
Uma risadinha veio de baixo da estante. –
Meu amigo, é uma coisa absurdamente reconfortante. Às vezes eu penso que é a
Natureza nos dizendo que tudo está bem.
De fato, havia um par de sapatos sob a
estante, feio, sujo e rasgado, pousado numa poça de lama.
- Eu já fui a muitos lugares, ouvi muitas
pessoas e senti todos os tipos de chuva...
O livro, indignado por um objeto imundo e
tresloucado como aquele querer lhe ensinar alguma coisa. Em sua fúria e desejo
de insultar nosso sábio sapato, ele, que estava numa posição muito precária,
acabou caindo da estante e deu de capa na lama.
O sapato achou muito engraçado um
objetozinho como aquele conseguir guardar
tanta petulância dentro de si.
- Deixe de ser tolo, camarada. Seja mais
como eu: me importo mais com algumas humildes experiências do que com uma
inteligência comprada e arrogante como a sua.
Por - Ana Caroline (eu!), Jéssica Santos, Vitor Luciano, Natália Ribeiro e Maria Victória